Meu olhar fixo não tem a menor chance com a tua cegueira. Minha cara de pau não tem a menor chance com a tua cara de cu. Meus cabelos soltos não têm a menor chance com teu rabo preso tampouco meus dedos hiperativos com as tuas mãos inertes (e como são). E minha suposta repulsa com a tua indiferença? E meu descontrole com teu ar blasé? Chance nenhuma. Meu mau humor não tem a menor chance com a tua satisfação profissional (eu diria que até pessoal) nem meus apelos com teu sono de velho caquético. Meu uísque das três da madrugada não tem a menor chance com teu sono profundo nem meus pesadelos das três da tarde com o teu recalque onírico. Meu caos pessoal não tem chance cm teu apartamento bem decorado minha veia dramática não tem a menor chance com o calor infernal da cidade em que pisas. O enorme trago de fumaça que jogo para dentro dos pulmões não tem a menor chance com a tua saúde frágil nem com a tua água (sempre) gasosa. Meus dezenove anos (ingênuos) não têm a menor chance com o teu passado ou presente nem minha pontuação preguiçosa com a bosta do teu português impecável.
Um dia eu vou acordar e vou ter recebido alta de mim mesma e vou sair vagando por aí, curada das minhas maluquices, satisfeita por ter reavido a consciência e cicatrizada de tudo aquilo que me feriu um dia.