quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

"Lua nova demais"

A verdade é que é difícil crescer. Mesmo quando o curso da vida é natural, mesmo quando as coisas acontecem na ordem cronológica certa: nascer, crescer, reproduzir, etc. É difícil crescer em todas as circunstâncias e a verdade é que, a não ser que se morra antes, nunca na história se ouviu falar de alguém que não tenha passado por isso.

Com ela foi diferente, não quanto a crescer, ela cresceu da mesma forma, como qualquer outra menina ela menstruou, ganhou peitos, coragem, potência, medo. Só que, ao contrário das outras meninas, ela não teve seu tempo de ensaiar como seria ser grande, pensar nome dos filhos, carregar a boneca contra o peito. Quando perguntavam o que ela queria ser quando crescesse, ela respondia "grande", no sentido literal da palavra, sem que nela existisse nenhuma carga de sonho, esperança ou perspectiva.

Mas ainda sim era só uma garotinha de marias chiquinhas e olhos tristes, alguém que gritava por orientação e afeto da mesma forma que continua gritando. E na carência da infância e na atmosfera dos vestidos cor-de-rosa, foi obrigada a crescer rápido demais, a amadurecer antes do tempo e aprender a se acostumar com tudo mal resolvido. Conformar-se com a conformidade das coisas, com a ausência de ternura, com a vontade acesa de que tudo fosse diferente. Acostumar-se com perguntas sem resposta, com as montanhas de presentes como forma de redenção. Criança, ela quis não precisar ser tanto, não ser corpo, não ser troncos e membros, ser só mente.

Aos olhos dos outros parecia perfeita e o fato de não possuir um semblante eufórico diante dos presentes diários, a fazia parecer, sob a ótica dos que não entendem de desamor, apenas uma menina mimada e mal agradecida. Eram incapazes de perceber quem desde cedo teve que lidar com a falta, quase sempre pior que o excesso, e com a enorme frustração de não ter estabelecido vínculos.

E, como num impulso vital, fez-se mulher, correndo atrás do que nunca tivera, pondo e repondo forças para prosseguir sem pensar em como seria se lá atrás as coisas tivessem sido diferentes. Através da casca de mulher madura e bem resolvida, mora ainda a mesma garotinha de óculos gigantes, maiores que o rosto, séria e carente de afeto. No fundo, ela ainda deseja a mesma coisa: tampar os vazios nas vísceras, preenchê-los de sangue e perspectiva. Nem sempre consegue, mas nunca deixou de tentar, e na vida longa dos que ainda não chegaram aos vinte, ela caminha, tentando enxergar além de uma sucessão de dias insuportavelmente vazios.